Ars Nova

Até o século IX pouco se tem de informação histórica sobre a Música.

Tivemos, então, a sociedade se apropriando da música para sua própria releitura. No leste europeu surgiram os bardos. Havia uma classe ambulante de músicos, os jograis e, habilidosos com vielas, rebecas, tambores e flautas, nascem os menestréis, cujo estilo se afastava muito do padrão religioso até então predominante.

Já no século XI, no interior dos palácios, os trovadores e poetas sentiram a necessidade de aprimorar a beleza de suas performances e declamações, convidando então os menestréis — músicos itinerantes — para acompanhá-los nas leituras de seus versos. Essa movimentação originou uma nova forma de compor, onde os sons passaram a ter durações diferentes e os instrumentos começaram a organizar-se para acompanhar a palavra cantada.

Enquanto a estrutura anterior de música religiosa é referida na história como Ars Antiqua, a inovação profana recebeu o nome de Ars Nova. Permeando a essência do desenvolvimento social da época, encontramos o pensamento filosófico Humanista.

O Humanismo trouxe uma nova dimensão ao homem até então oprimido pela Igreja, um Deus vingador e o Inferno, que ao lado da realeza faziam o papel de estado. A partir deste momento, o homem tornou-se centro de todas as coisas — descobriu que podia pensar e, através do seu pensamento, criar um novo Universo.

Muito embora nos dias de hoje nossos parâmetros musicais tenham tomado uma proporção completamente diferente, o movimento de sua origem nos traz importante lição sobre os caminhos evolutivos de nossa sociedade.

Não pretendo tratar aqui, constantemente, de assuntos de Música — minha especialidade, de fato, é o setor empresarial e todo o seu aparato jurídico. No entanto, acredito que batizar esta coluna de “Ars Nova” não é apenas uma maneira de homenagear minha avó e professora de piano, que me apresentou todo o conceito e base histórica que reproduzo aqui, mas é também uma forma de homenagear as mudanças que movimentos culturais e sociais nos trouxeram através dos séculos, fundamentadas (ainda que inconscientemente) no desejo do homem de ser reconhecido como indivíduo criativo e capaz de construir, modificar e se responsabilizar pelo progresso.

Se outrora a música foi usada como ferramenta fundamental na expressão de individualidade e na conquista de autonomia do indivíduo diante do estado, hoje contamos com a inserção da liberdade nas mais variadas atividades, maximizando o efeito revelador que esta possui.

Acredito profundamente que um dos caminhos mais eficazes para estabelecer as liberdades individuais, civis e econômicas em uma sociedade que se projeta nos trilhos da mudança, é o da lei.

A justiça por vezes se sobrepõe naturalmente à lei, e quando conseguirmos disseminar este entendimento estaremos valorizando o poder e a expressividade do indivíduo. Talvez, quando conseguirmos desassociar os direitos do indivíduo aos direitos coletivos (atualmente tão mal defendidos e empregados), sejamos capazes de criar um sistema legal “profano” — uma “Ars Nova” jurídica, que não censure o exercício da soberania individual nem interfira em demasia nas relações de sociedade entre pessoas livres.

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